A irrigação se torna essencial para a produção de café no Brasil diante das mudanças climáticas
Preços sobem com a escassez de oferta e impactos da seca
Preocupações com o uso da água no avanço agrícola da Bahia
Por Marcelo Teixeira e Roberto Samora
A seca castigou severamente os cafeicultores brasileiros no ano passado, ressecando os cafezais e impulsionando os preços internacionais do grão a patamares recordes. No entanto, Rodrigo Brondani está otimista com uma colheita abundante. Sua enorme plantação no cerrado da Bahia, no nordeste do país, contrasta com as tradicionais lavouras montanhosas típicas da América Latina.
Enquanto observa as fileiras de plantas carregadas de frutos verdes, um sistema de irrigação gira ao fundo, traçando círculos amplos sobre as árvores a partir de um pivô central – como o ponteiro de um relógio.
“Está muito promissor”, afirma Brondani, gerente da fazenda Joha, que possui 900 hectares de cafezais irrigados – uma área mais de 20 vezes superior à média das propriedades brasileiras. Esse modelo de produção em larga escala com acesso à irrigação tem ganhado importância para sustentar a crescente demanda global de café. O Brasil, maior produtor mundial, vem expandindo a cafeicultura na parte oeste da Bahia, uma nova fronteira agrícola onde a irrigação se tornou regra.
Na fazenda Joha, Brondani espera colher até 80 sacas de 60 quilos por hectare – o dobro da média nacional. Considerando os preços atuais de mercado, a colheita mais recente, encerrada em outubro, deve render cerca de US$ 17 milhões.
A Reuters conversou com mais de 20 produtores, técnicos, agrônomos, especialistas em irrigação e executivos do setor para entender como as mudanças no regime de chuvas, aceleradas pelas alterações climáticas, estão reformulando a cafeicultura brasileira.
Tradicionalmente, os cafeicultores dependiam das chuvas abundantes da primavera e do verão. Seca era algo raro, e apenas 30% das plantações contavam com irrigação, segundo estimativas do setor.
Esse cenário, porém, começou a mudar após a seca do ano passado. A irrigação está se tornando indispensável, apesar dos altos custos envolvidos, que variam de acordo com a distância até fontes de água e a profundidade do lençol freático.
Em algumas áreas de Minas Gerais – principal estado produtor de café do Brasil –, o rebaixamento dos lençóis freáticos já dificulta o abastecimento de água para as propriedades irrigadas.
Na Joha, os cafezais são dispostos em nove círculos gigantes que se tocam na imensidão do cerrado, favorecendo a irrigação por pivô central. Há água suficiente para manter o sistema funcionando até 20 horas por dia. O contraste com as lavouras afetadas pela seca no ano passado é nítido: as plantas verdes e viçosas substituem as árvores ressecadas que não resistiram à estiagem.
Quando finalmente choveu, já era tarde para salvar a safra de 2025. Muitas das árvores que sobreviveram, especialmente em Minas Gerais, ficaram debilitadas e devem produzir menos grãos neste ano. Como o Brasil é responsável por cerca de 35% do consumo mundial, analistas projetam nova queda na oferta nacional.
“Sem irrigação, fica muito difícil produzir café de forma rentável”, diz Osmar Júnior, produtor mineiro que viu sua produção despencar de 2 mil sacas em 2020 para apenas 700 em 2024, por falta de irrigação.
Segundo a Organização Internacional do Café, 2025 deve marcar o quarto ano, em um intervalo de seis, em que o consumo global supera a produção. Nos últimos três anos, o mundo consumiu 12,5 milhões de sacas – o equivalente a 750 mil toneladas – a mais do que foi produzido, o que representa cerca de 7% da oferta anual global.